Estamos num período de instabilidade em que os aguaceiros e a trovoada são frequentes e têm intensidade suficiente para provocar alguns estragos localizados. Como se forma a trovoada é uma dúvida que muita gente gostava de ver esclarecida, bem como perceber porque é tão difícil de prever a sua localização e horários.
Vou tentar explicar da forma mais simples possível uma situação que é em si bastante complexa. Primeiro as condições para a formação das nuvens que lhe dão origem e depois a forma como descarregam e alguns fenómenos associados.
As nuvens que originam a trovoada são cúmulos com desenvolvimento vertical, que se formam quando o ar mais quente e húmido tem condições para subir até às capas altas da troposfera sem nada que o impeça.
A sua base é normalmente à volta dos 2000 metros e crescem na vertical até aos 5000 ou 6000 metros de altitude se forem cúmulos congestus e até aos 9000 a 11000 metros se forem cumulonimbos. Nas regiões tropicais os cumulonimbos podem atingir os 16000 metros de altitude.
Para que o ar suba de forma isolada a temperatura tem que descer com a altitude à razão de 10 ºC ou mais por cada 1000 metros enquanto não há nuvem e a mais de 6 ºC por cada 1000 metros a partir da base da nuvem.
Quando se reúnem estas condições sabemos que se podem formar nuvens com desenvolvimento vertical.
Quando a temperatura desce com a altitude menos de 6 ºC por cada 1000 metros dizemos que há uma inversão térmica, que funciona como um inibidor das ascendências e impede o crescimento vertical das nuvens.
As inversões bem definidas evitam a formação de nuvens de trovoada. Se forem fracas e mal definidas evitam em determinados períodos mas se as temperaturas à superfície subirem muito podem ser superadas.
Frio em altitude, ausência de inversões térmicas e calor à superfície são as condições necessárias para a formação de nuvens com desenvolvimento vertical.
A formação de cúmulos é designada em meteorologia como convecção.
Alguma vez se interrogaram porque refrescamos quando nos molhamos?
Quando a água evapora rouba calor ao nosso corpo. O vapor de água leva essa energia com ele.
Aquando da formação das nuvens devido à condensação do vapor de água transportado pelo ar ascendente que vai arrefecendo à medida que sobe, o calor roubado na evaporação é devolvido na condensação.
É o chamado calor latente que vai reforçar a diferença de temperatura entre o ar da nuvem (mais quente) e o ar seco que a rodeia (mais frio). Este fenómeno reforça muito o crescimento vertical da nuvem.
A convecção é responsável pelo transporte de quantidades enormes de energia. As nuvens quando atingem uma dimensão média ganham vida própria e podem crescer de forma explosiva em poucos minutos.
Dentro de um cumulonimbo há ascendências e descendências muito violentas que acabam por criar a energia eléctrica que dá origem aos trovões e relâmpagos com que nos brinda a trovoada.
O ar mais quente tem capacidade para conter mais vapor de água do que o ar frio, por isso as trovoadas são mais frequentes e poderosas com tempo quente.
Com tempo frio também podem ocorrer trovoadas, quando a temperatura desce de forma muito acentuada com a altitude, mas são normalmente menos violentas porque a quantidade real de vapor de água é bastante menor.
As previsões de trovoada têm que ser feitas sempre no condicional. Quando há condições para a formação de nuvens com desenvolvimento vertical temos que dizer que são possíveis.
Quando há boas inversões térmicas podemos dizer que não há condições para a ocorrência de trovoada.
Como se trata de nuvens isolados e que se formam de forma rápida e dispersa nunca sabemos prever exactamente onde e quando vão descarregar.
Pode chover forte e cair granizo num local, e não chover nada escassos kms ao lado. A variabilidade e velocidade com que se formam os cumulonimbos é tal que mesmo com modelos de curto prazo se podem definir previsões pormenorizadas.
Para além da curva de estado (variação da temperatura com a altitude) os ventos podem ajudar ou inibir a formação de nuvens de trovoada.
A confluência de ventos fracos com direcções opostas à superfície favorece as ascendências, logo a formação de cúmulos. Em Portugal é famosa a confluência entre os ventos de componente Leste e a frente fria de brisa marítima de componente Oeste e Noroeste.
Nas montanhas a confluência das brisas das varias encostas e vales também favorecem as ascendências.
O vento forte, quer à superfície, quer em altitude, funciona como um inibidor da formação de nuvens com desenvolvimento vertical. Dispersa as ascendências e impede o crescimento das nuvens.
Quando uma nuvem de trovoada já está a descarregar pode verificar-se uma descendência explosiva de ar frio que ao chegar à superfície se espalha rapidamente em todas as direcções e a ajuda à formação de novas ascendências também elas explosivas.
É o famoso downburst que ocorre mais vezes do que se imagina, com violências variadas. Quando é mais violento os remoinhos das ascendências acabem por fazer estragos.
Muita gente se interroga como é possível cair granizo com temperaturas tão elevadas. O problema advém da altura da nuvem.
Num dia de trovoada que se preze a nuvem sobe até aos 11000 metros de altitude ou até mais, onde a temperatura ronda os 60 ºC negativos. As ascendências dentro da nuvem obrigam as gotículas de chuva a subir várias vezes a essas altitudes criando grandes blocos de gelo que são suficientemente grandes para aguentarem as temperaturas positivas da superfície.
A diferença entre os dias em que cai granizo e os que é apenas chuva tem a ver com a altura que a nuvem pode atingir.
Neste Domingo isso pode acontecer. Esta é a previsão:
Altura da nuvem 12000 metros, temperatura no topo -60,9 ºC.
O vento é relativamente fraco, não há nenhuma inversão com significado.
No mês de Maio estes dias são mais frequentes pois ainda há bastante frio em altitude e as temperaturas à superfície já vão atingindo valores elevados.
Esta semana o tempo vai continuar bastante instável e as temperaturas vão descer significativamente.
A chuva e os aguaceiros serão bastante frequentes em todas as regiões, mas são mais intensos e frequentes no interior Norte e Centro.
As trovoadas podem continuar a ocorrer mas as mais fortes devem ser neste Domingo. Durante a semana o tempo mais fresco pode fazer com que a violência das trovoadas seja menor.
A chuva pelo menos tem uma vantagem, vai atrasando a época de incêndios.
O inicio de Junho parece que vai ser fresquinho. Brevemente farei previsões mais detalhadas para o mês de Junho.
Foto de uma trovoada na raia por Manuel Ferreira